Thursday, July 31, 2008

Uma Pequena Nota Sobre O Iluminado (SPOILER)

Assisti O Iluminado esses dias. Soberbo, não preciso nem dizer o quanto o filme é bom. Mas uma coisa me intrigou.


A esposa de Jack é tão esquisitona e faz uma cara de medo tão boa que eu tive vontade, o filme todo, que ele a matasse e esquartejasse, salvando-se apenas o garoto, um final até honesto. Aliás, posso me lembrar da sensação de querer, em um filme, que algum personagem "do bem" morra nas mãos do vilão por ele ser chato, idiota ou estranhinho. E normalmente ele morre mesmo.


Terá sido a intenção de Mr. Kubrick? E dos outros? Alguém compactua ou eu preciso de ansiolíticos?



Thursday, July 03, 2008

Deriva III

Estive escrevendo bastante, numa existência um pouco vampiresca, mas acho que agora já sei o que dizer para concluir (pero no mucho) essa história da Deriva. Eu falava então do mar de tocos e restos em que se transformou a vida urbana, e trouxe o amigo Eco pra falar um pouco de linguagem poética.

Pois.

Esta experiência de urbanidade conturbada e profundamente centralizada no sujeito narcisista aparece na cinematografia nacional desde o crescimento industrial brasileiro, na década de 50, tendo em seus exemplos mais notáveis São Paulo S.A. (1965), de Luís Sérgio Person e, no ápice da descontrução da linguagem fílmica, Bang Bang (1963), de Andrea Tonacci. Neste filme a falta de sentido e de narrativa pessoal é traduzida na forma do filme: não há um enredo coerente possível, as sequências são completamente desencadeadas, os diálogos são absurdos.


A cena inicial do filme já revela a regra que ele vai seguir: um passageiro entra num taxi, manda ele ir pra frente, mas não diz onde quer chegar. Muda as instruções de repente, fala que era pra virar aqui, virar ali, o condutor se irrita, briga com o passageiro, faz o retorno...

Mais tarde, no filme, a mesma cena se repete.

Disse Ismail Xavier, em seu livro Alegorias do Subdesenvolvimento (Cinema Novo, Tropicalismo, Cinema Marginal) sobre Bang Bang:

é da análise da composição de mise-en-scène, assumidas em sua radicalidade formal, que o comentário sobre o mundo se reinstala: o jogo interno, afinal, não pode se fazer em estado de pura abstração e a presença do mundo na imagem e no som traz de volta enunciados sobre o contexto do filme que cabe comentar.
E o que isso quer dizer?, não é mesmo?

Os personagens vão passando por várias situações que não se encaixam. Vão surgindo tentativas de montar uma história, um fio condutor, um caminho, mas essas tentativas são, uma a uma, sabotadas. Quando você acha que está perto de entender que Pereio está sendo sequestrado, vem uma cena dele dirigindo o carro dos ladrões, eles dando tiros para o ar e se divertindo.

Mais Ismail Xavier, pra fechar esse texto (um pouco confuso, me desculpem, mas é a experiência conturbada da vida urbana)

O mundo em que se movimenta o passageiro é um labirinto e só não se faz drama porque sua norma, no plano diegético, é a incosequência. O ar irônico, imperturbável, deste homem comum face ao absurdo das peripécias é resposta que revela certa afinidade com este mundo serial desconexo: ele se ajeita a tudo, abosrve cada recomeço com certo descompromisso. Está e não está. E sua postura de exterioridade face face aos conflitos condensa muito bem a matriz de um anti-herói sem proejto que protagoniza a comédia num mundo em crise, terreno de violência e desastre. Seu à vontade a cada passo atesta sua cumplicidade com as regras, o que o isenta da tensão e desconforto que atinge a plateía às voltas com o quebra-cabeça.
Tem ou não tem tudo a ver?