Thursday, December 20, 2007

crônica-desabafo

De museus...
Não tenho conhecimento suficiente para escrever sobre qual a origem dos museus, seu grande significado, e sua importância na história da humanidade. Exigiria um repertório que não tenho e acima de tudo um extensa pesquisa. Dito isso o que faço aqui é especulação. Os museus, tais como os conhecemos hoje, abertos ao público, servem como casas das obras. Eles acomodam o ápice da criação artística da humanidade, podemos ir e ver uma obra, saímos, uma semana depois voltamos e lá nos deparamos de novo com o objeto de nosso encanto. Reestudamos, sentamos, convivemos com ele abertamente, plenamente. Sentimos novas emoções, revivemos antigas. Uma única vista não esgota uma obra de arte - nem uma nem várias, é uma contemplação eterna. Conservar essas obras e tratá-las bem é, então, uma celebração da humanidade e condiz com um certo papel civilizador da cultura.

De assaltos...
Hoje logo pela manhã surge a notícia de que o MASP foi assaltado. Uma tragédia. Levaram um quadro de Portinari e um de Picasso. Ao ver logo de cara a manchete no uol (ladrões furtam portinari e picasso do MASP) pensei "putz, aquele retrato meio azulado daquela mulher". Não foi um pensamento muito elevado, dotado de uma grande análise estética; foi impulsivo. Depois a matéria do uol - confirmando meu medo - me recordou o verdadeiro nome do quadro de Picasso, "O retrato de Suzanne Bloch". Bateu uma tristeza.
Por vezes me deparei com aquele quadro no MASP, sei lá, no mínimo 5, e agora ele não estará mais lá. Saia do museu e sabia que poderia voltar lá e rever aquela mulher, conviver novamente com aquele angustia, aquela melancolia. Não poderei mais...
Do incalculável...
Neste momento diversos analistas comentam a importância histórica daquele quadro, do período de transição de Picasso, da fase azul do artista, do valor incalculável da obra e diversas coisas. Na real não me importo. No meu humilde egoísmo me entristeço por não poder contemplar mais aquela figura, aquele cabelo meio esquisito, aquela cara carrancuda me fitando e uma dor, uma introspecção que vinha não sei de onde. Na última vez que vi o retrato ele estava próximo de uma série de retratos de Modigliani, era fascinante vê-los lado a lado e passar longos momentos de contemplação. Não foi só a obra que foi roubada mas perderam-se também diversas comparações e conversações. Perde-se um certo compartilhamento de sensações possível ao ver num mesmo lugar o retrato de Suzanne Bloch, um auto retrato de Gauguin, uma paisagem de Monet, um pastel de Tolouse-Lautrec e tantas outras relações menos óbvias do que essas que eu citei vindas daquela multidão de obras primas que é o MASP.
Parece piegas o que vou dizer mas realmente as obras que lá estão ficaram mais sozinhas. Perdeu-se algo de indescritível, incalculável porque não está sequer no campo do cálculo, era algo que simplesmente se vivia; saber que nunca mais verei aquele quadro fez o mundo ficar, para mim, um pouco menos belo.
cae...
Retrato de Suzanne Bloch
óleo sobre tela, 65x54 cm, 1904.
Picasso, Pablo (1881-1973)


2 comments:

Douglas said...

Duas teorias de conspiração me vem a cabeça. Não acredito em nenhuma.

Primeira: Alguém contrário a administração do MASP encomenda os furtos para foder com tudo e radicalizar com a situação.

Segunda: A própria administração furta pra conseguir publicidade e expor a situação precária do museu. Com isso vão conseguir mais doações e assim reerger o MASP.

Mas o mais provável é que seja uma das duas opções levantadas pela polícia. Furto encomendado por colecionador, ou sequestro de obras.

Enfim, uma cagada. Eu gostava muito do quadro do Portinari...

Henrique Cartaxo said...

"No século XIX, surgiram os museus públicos, onde aprendizes iam estudar pintura.

A Antologia coloca em questão os cânones, porque os coloca em comporação, destruindo a noção de referência absoluta. Isto abre espaço para movimentos modernistas."

Anotação de uma aula do Monsieur Jorge Coli.