Sunday, October 19, 2008

Livros, escolas e museus

Vimos na virada entre o XIX e o XX a filosofia e a física quântica ignorarem a distinção entre espaço e tempo, para em seguida ver a imagem perspectivista encontrar de fato o tempo e com um ilusionismo maravilhoso se mover. No mesmo passo uma questionável ciência fincava suas bases para permanecer em nossas cabeças até hoje e além, e que trata do mundo daquilo que nos habita as mentes e, sem o nosso conhecimento, determina nossas decisões e até os nossos mais acidentais tropeços; essa tal Psicanálise, mãe e pai, filha e irmã deste sujeito narcisista de nosso tempo. Tivemos as guerras mundiais e o rádio e a televisão nos bombardeando as cabeças dentro de casa, com as vozes e as caras de presidentes, de palhaços, de varejistas; e houve aqueles que puseram-se a votar, a rir, a comprar, ou a pensar que os três não eram senão um só, o mesmo, uma imagem num tipo especial de espelho que nos colocava sentados, imobilizados, mas de olhos e ouvidos abertos, em toda parte do mundo. Hoje temos diante de nós estas máquinas computadoras, ligadas todas umas as outras pela Internet, em que depositamos infinitas idéias, seja em imagens, sons, palavras. Entramos numa fase em que todo conteúdo é de todos, a transmissão da informação se dá em redes complexas, intricadas, onde cada ponto pode emitir seus impulsos e vê-los reverberar em todos os outros. Logo veremos essa rede se desmanchar não mais em pontos, mas num contínuo infinito. O homem terá criado o seu meta-universo.

Continuo então a traçar as diagonais de Debray. É verdade, como disse Barra/.Ponto (em comentário no post anterior), temos Wiki-Museus dos mais interessantes, com café e biscoito feito em casa. Mas eu defendo o livro. Bem parcial mesmo, defendo porque adoro.
“Quando apanhava um livro, podia abrí-lo e fechá-lo vinte vezes, via muito bem que ele não se alterava. Deslizando sobre essa substância incorruptível, o texto, meu olhar era apenas um minúsculo acidente de superfície, não atraplhava nada, não gastava. Eu, em contrapartida, passivo, efêmero, era um pernilongo ofuscado atravessado pelos clarões de um farol; abandonava a escrivaninha, apagava a luz: invisível nas trevas, o livro continuava cintilando; por si só. Eu infundiria às minhas obras a violência desses jatos de luz corrosivos e, mais tarde, nas biblitoecas em ruínas, elas sobreviveriam ao homem."
(Em As Palavras, de Sartre)
Foi sobre o livro e sobre a pedra da cultura escrita que se criou e se recriou a civilização ocidental, dos textos sagrados que corporificaram a revelação divina, em lugar dos anjos, aos textos seculares que corporificam o saber, em lugar da oralidade.

Acho que vai sair um texto grande, continuo depois.


1 comment:

Anonymous said...

queria acreditar que nem livro nem cinema desparecerão no futuro. mas como competir o alto custo de uma produção que dificilmente é usufruída em todo seu valor, desjustificando sua mesma existência, não ao coração do homem, que prefere a integridade à opção, mas ao capital, democraticamente eleito para julgar a dignidade dos esforços e o direito à existência de tudo que se pode liquefazer em dinheiro.
os modelos sobreviverão, a superfície de longos pensamentos, a tela mágica na sala escura. mas o capital é impiedoso, e mesmo o nosso carinho mais poderoso não salvará os últimos gramofones.
digo tudo isto com pesar.